Certa
vez, ChicoTraira [eu tive o prazer de ter convivido com ele na cidade
de Assu-RN, na década de oitenta] cantando na casa de um amigo, com
outro notório poeta do repente e da viola chamado Manoel Calixto,
recebeu o desafio com a seguinte estrofe:
Avise ao dono da casa
Que não vá fazer asneira
Tenha cuidado em Traira
Que ele tem uma coceira
Se não quiser que ela pegue
De manhã queime a cadeira.
Chico retrucou:
Você é que tem coceira
Dessas que arrebenta a calça
Está tomando por dia
Dezoito banhos de salsa
Quando a coceira se dana
Num dia acaba uma calça.
De
outra feita, Chico viajando de Natal com destino a cidade litorânia de
Macau, interior da terra potiguar, em cima da carroceria de um caminhão,
em companhia de outro
poeta cantador de viola chamado
Patativa*, escultou dele, Patativa, o seguinte: "Traíra*, eu acho que
essa viagem não vai ser muito sublime!" Patativa se referia aos
balanços que vinha sentindo em razão da trepidante estrada esburacada.
Pois bem, Chico pegou na deixa, dizendo no melhor da sua inspiração e
criatividade poética:
Se o amigo não está
Achando a viagem boa
Você é pássaro, eu sou peixe
Eu mergulho e você voa
Você volta para o ninho
E eu volto a minha lagoa.
* Patativa: Pássaro de canto melódico e suave.
* Traira: Peixe de água doce muito comum nos rios, açudes e lagoas do Nordeste brasileiro.
Chico Traira fora convidado para
participar de uma solenidade em homenagem a Câmara Cascudo [que se
tornou por merecimento, o escritor potiguar mais conhecido no mundo], realizado pela UFRN. Chegando a sua vez,Traira improvisou a sextilha ao som da viola, que transcrevo abaixo:
Eis o doutor Cascudinho*
Que valoroso tesouro!
Lá no sertão também tem,
Cascudo, aranha e besouro.
Os de lá não valem nada.
Mas este aqui vale ouro.
*Cascudinho: Como era chamado Cascudo, pelos seus mais íntimos.
O
poeta-violeiro, jornalista Rogaciano Leite, cantava com o conhecido Cego
Aderaldo [Aderaldo Ferreira de Araújo - 1878-1967], cearense do Crato,
numa feira livre da cidade do Recife-PE. Rogaciano ao ver se aproximar,
salvo engano, o músico seresteiro Sílvio Caldas, debochou com Aderaldo:
"Tô cantando com esse velho, esse velho que não serve pra mais nada, que
devia tá numa rede todo enferrujado" e coisa e tal. Aderaldo não se fez
de rogado, rimando na horinha, conforme adiante:
Andei procurando um besta
Um besta que fosse capaz
E de tanto procurar um besta
Encontrei esse rapaz
Que não serve pra ser besta
Porque é besta demais.
Fernando Caldas
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