segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Certa vez, ChicoTraira [eu tive o prazer de ter convivido com ele na cidade de Assu-RN, na década de oitenta] cantando na casa de um amigo, com outro notório poeta do repente e da viola chamado Manoel Calixto, recebeu o desafio com a seguinte estrofe:
Avise ao dono da casa

Que não vá fazer asneira

Tenha cuidado em Traira

Que ele tem uma coceira

Se não quiser que ela pegue

De manhã queime a cadeira.


Chico retrucou:


Você é que tem coceira

Dessas que arrebenta a calça

Está tomando por dia

Dezoito banhos de salsa

Quando a coceira se dana

Num dia acaba uma calça.


De outra feita, Chico viajando de Natal com destino a cidade litorânia de Macau, interior da terra potiguar, em cima da carroceria de um caminhão, em companhia de outro 
poeta cantador de viola chamado Patativa*, escultou dele, Patativa, o seguinte: "Traíra*, eu acho que essa viagem não vai ser muito sublime!"  Patativa se referia aos balanços que vinha sentindo em razão da trepidante estrada esburacada. Pois bem, Chico pegou na deixa, dizendo no melhor da sua inspiração e criatividade poética:

Se o amigo não está

Achando a viagem boa

Você é pássaro, eu sou peixe  

Eu mergulho e você voa

Você volta para o ninho

E eu volto a minha lagoa.


* Patativa: Pássaro de canto melódico e suave.

* Traira: Peixe de água doce muito comum nos rios, açudes e lagoas do Nordeste brasileiro.


Chico Traira fora convidado para participar de uma solenidade em homenagem a Câmara Cascudo [que se tornou por merecimento, o escritor potiguar mais conhecido no mundo], realizado pela UFRN. Chegando a sua vez,Traira improvisou a sextilha ao som da viola, que transcrevo abaixo:


Eis o doutor Cascudinho*

Que valoroso tesouro!

Lá no sertão também tem,

Cascudo, aranha e besouro.

Os de lá não valem nada.

Mas este aqui vale ouro. 


*Cascudinho: Como era chamado Cascudo, pelos seus mais íntimos.

O poeta-violeiro, jornalista Rogaciano Leite, cantava com o conhecido Cego Aderaldo [Aderaldo Ferreira de Araújo - 1878-1967], cearense do Crato, numa feira livre da cidade do Recife-PE. Rogaciano ao ver se aproximar, salvo engano, o músico seresteiro Sílvio Caldas, debochou com Aderaldo: "Tô cantando com esse velho, esse velho que não serve pra mais nada, que devia tá numa rede todo enferrujado" e coisa e tal. Aderaldo não se fez de rogado, rimando na horinha, conforme adiante:

Andei procurando um besta

Um besta que fosse capaz
E de tanto procurar um besta
Encontrei esse rapaz
Que não serve pra ser besta 
Porque é besta demais.

Fernando Caldas

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